O empregador pode conceder prêmios habituais aos empregados sem se preocupar com os encargos trabalhistas e previdenciários?
É fato que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) sofreu substanciais alterações com o advento da Lei 13.467/2017, intitulada de “Reforma Trabalhista”.
Dentre os seus grandes destaques, extraem-se as disposições do intitulado “acordado sobre o legislado” (art. 611-A), trabalho intermitente (art. 452-A), teletrabalho (art. 75-B), quitação anual de obrigações trabalhistas (art. 507-B) e exclusão das “horas in itinere” (art. 58, §2º).
Em igual sentido, algumas parcelas pagas pelo empregador perderam, em tese, a sua natureza salarial, não integrando a remuneração do empregado, conforme se constata no descrito no §2º do artigo 457 da CLT, senão vejamos:
Art. 457(…)
(…)
- 2º As importâncias, ainda que habituais, pagas a título de ajuda de custo, auxílio-alimentação, vedado seu pagamento em dinheiro, diárias para viagem, prêmios e abonos não integram a remuneração do empregado, não se incorporam ao contrato de trabalho e não constituem base de incidência de qualquer encargo trabalhista e previdenciário.
Especificamente no que diz respeito aos prêmios, o prescrito no §4º do artigo 457 da CLT assim conceitua:
- 4ºConsideram-se prêmios as liberalidades concedidas pelo empregador em forma de bens, serviços ou valor em dinheiro a empregado ou a grupo de empregados, em razão de desempenho superior ao ordinariamente esperado no exercício de suas atividades.
Pelo que se denota no mencionado dispositivo, a finalidade do legislador é notoriamente no sentido de estimular maior produtividade e desenvolvimento do empregado, o qual acaba sendo beneficiado (também) financeiramente, cujos encargos/reflexos, seja de natureza trabalhista ou previdenciária, não incidem sobre valor pago nesse cenário, o que por conseguinte, isenta o empregador de tais ônus, de igual modo.
Dito de outra forma, as disposições concernentes ao instituto da premiação trazem benefícios múltiplos, mirando tanto no empregado (estimulando-o profissional e financeiramente) quanto no empregador (incentivando-o a impulsionar o crescimento da empresa com profissionais cada vez mais engajados e sem ônus acessórios em virtude do pagamento).
Contudo, é necessário cautela antes mesmo de se pensar na concessão de premiações aos empregados, isto é, o prelecionado no dispositivo em testilha não deve ser interpretado restritivamente, cuja aplicabilidade requer análise prévia e criteriosa, senão vejamos.
Malgrado o exposto na parte inicial do §2º do artigo 457 da CLT, qual seja: “As importâncias, ainda que habituais, pagas a título de (…) prêmios (…)”, a habitualidade não pode ser confundida com “pagamento mensal” por exemplo, sob pena de traduzir-se em salário a apontada parcela.
Não se pode olvidar as corriqueiras práticas de “camuflagem” de salários por muitos empregadores, os quais, como é sabido, lançam no contrato de trabalho do empregado um valor menor a título de salário e “por fora” pagam muito mais, se furtando consequentemente dos encargos trabalhistas e previdenciários.
Com a aplicabilidade do prêmio restritamente ao contido no texto legal (art. 457, §2º da CLT) também não será diferente, ou seja, o empregador valerá de uma “gorda” parcela a título “prêmio” em pagamento mensal ao empregado que, do mesmo modo, terá ínfimo valor registrado em sua carteira de trabalho, eximindo-se aquele do pagamento dos encargos.
Sucede que a intenção do legislador, como outrora informado, é a de estimular o empregado a produzir e desenvolver melhor (art. 457, §4º da CLT), e igualmente, que o empregador o premie sem receio de arcar com os custos refletidos no valor pago ao primeiro.
A propósito, convém destacar a exposição de motivos relativos ao artigo em voga (art. 457 da CLT), oriunda da comissão especial destinada a proferir parecer ao projeto de Lei n° 6.787/2016 [1] (proposição originária da Lei 13.467/2017):
(…)
A nossa intenção com a mudança proposta ao art. 457 é a de permitir que o empregador possa premiar o seu funcionário sem que isso seja considerado salário. É o caso, por exemplo, de reclamações comumente ajuizadas em que se requer a incorporação ao salário de um prêmio por vendas – uma viagem ou determinado objeto.
O efeito concreto disso é a retração do empregador, que evita conceder esses prêmios sob o risco de vê-los incorporados ao salário, caracterizando um claro prejuízo aos empregados.
Nesta linha de raciocínio, embora ainda não haja posição jurisprudencial mais clara, precisa e segura sobre as disposições contidas no artigo 457 da CLT, é imprescindível que o empregador, caso ainda assim decida conceder prêmios aos seus empregados, com base em decisões mais recentes (pós-reforma trabalhista), atente-se para o seguinte, cumulativamente:
1 – Que haja prévia elaboração/formalização de critérios objetivos a fim de justificar claramente o que seria “desempenho superior ao ordinariamente esperado no exercício de suas atividades”;
2 – A confecção deste documento (prevendo os parâmetros autorizadores da concessão do prêmio) deverá levar em consideração a função exercida pelo empregado ou grupos de empregados, a realidade da empresa e a sua dinâmica/eventualidade, ou seja, não pode haver mensalmente o pagamento livre e injustificado de valores a título de prêmio;
3 – Recomenda-se que sejam concedidos os prêmios, por liberalidade, no máximo 02 (duas) vezes por ano, após apuração criteriosa/objetiva dos tópicos/parâmetros previamente definidos, cujos valores e períodos (dentro dos limites anuais) podem variar, evitando-se a habitualidade discutida.
Portanto, inobstante haja previsão legal expressa autorizando a concessão de prêmios ainda que de forma habitual, de acordo com entendimentos jurisprudenciais mais recentes (porém nada pacificado), o mais seguro ao empregador seria a aplicação formal e objetiva de critérios prévios para tanto, isso em consonância com a realidade da empresa e do cargo do empregado, aliada à eventualidade do benefício (sugere-se no máximo 2 vezes por ano), e que possa variar, uma vez que deve constituir (cumulativamente) mera liberalidade do empregador.
[1] https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1544961 (acessado em 31.05.2023)
Sobre o autor
Welber Marcos de Sousa Miranda é Advogado, atua como coordenador de projetos na área legal do escritório Prado Advogados Associados – Cuiabá/MT. Especialista em Direito Civil e Processo Civil pelo Grupo ATAME (Universidade Cândido Mendes). Pós-Graduado em Direito do Agronegócio pela FESMP/MT e em Processo Civil Empresarial.
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